quinta-feira, 10 de julho de 2014

Repartir o Pão é partilhar DEUS!

A cruz é o símbolo católico do Cristianismo. Segundo publicitários, a mais simples e genial logomarca já criada: dois pedaços de pau cruzados ou apenas dois riscos perpendiculares gravados na parede, ou ainda dois dedos colados, uma na vertical e outro na horizontal. 
Há um paradoxo pois a confissão religiosa que celebra a vida como dom maior de Deus adote como símbolo um instrumento de morte. Cruzes são encontradas nos cemitérios, nas tumbas. Não é o caso de Jesus de Nazaré, que deixou vazio o túmulo de pedra. Sua morte não o fato central da Fé cristã. O fato central é sua gloriosa Ressurreição do meio dos mortos. Como dizia São Paulo, não houvesse Jesus ressuscitados dos mortos, a nossa fé seria vã! (1 Cor 15,14) O desafio então que se impõe passou despercebido aos olhos dos teólogos. Perguntamos então: como é possível simbolizar a Ressurreição? Porque se o centro da Fé Cristã não é a morte e sim a Ressurreição, que outros sinais poderiam representar o triunfo de Jesus sobre as forças tenebrosas da morte?
Até hoje não encontrei ninguém que fosse criativo o suficiente para consegui-lo. Na Igreja Primitiva era o peixe o símbolo secreto da Fé cristã, em referência ao Batismo. Assim como os peixes vivem nas profundezas do mar, dos rios e dos lagos, os cristãos mergulhados nas catacumbas, onde foram encontradas várias pinturas de peixes, renasciam pela água batismal. Para Santo Agostinho, Cristo é o Peixe vivo no abismo da mortalidade, como em águas profundas (Cidade de Deus, XVIII, 23). Além disso, peixe em grego era acróstico de Jesus Cristo Filho do Deus Salvador.
Foi a perseguição romana que induziu as comunidades a adotar a cruz, instrumento de suplício e morte do Império. Nela Jesus foi sacrificado. A mais antiga cruz que se conhece data do século IV e está gravada no portal da Igreja de Santa Sabina, em Roma, no monte Aventino, anexa ao convento que abriga o governo geral da Ordem dos Dominicanos.  Cessada  perseguição à Igreja, a cruz passou da clandestinidade para a centralidade nas torres dos Templos. E, aos poucos, tornou-se o eixo simbólico do Cristianismo. A ponto de a Via Sacra, antes da Reforma Litúrgica promovida pelo Concílio Vaticano II, contar com apenas 14 estações. Hoje nos livretos, encontramos 15 e assim a Ressurreição de Jesus é expressa como o ponto culminante dessa forma de devoção cristã. 
A predominância da cruz incutiu no catolicismo uma espiritualidade lúgubre. Não por acaso os sacerdotes se vistam de preto. O riso, a alegria, as cores, pareciam banidos da Liturgia. Enfatiza-se mais a morte de Jesus pela redenção de nossos pecados correndo o risco de esquecer a ressurreição como vitória da vida, de Deus sobre os poderes da morte. Sempre se correu o risco de super valorizar a dor em lugar do amor. Para a pergunta feita sobre como simbolizar a Ressurreição respondemos que por meio de algo que represente a vida. Sinceramente, não conheço nada melhor do que o Pão. Ao que parece, temos isto na Ceia de Jesus, na Oração que Jesus ensinou, nos gestos da partilha e da comunhão. O pão é um alimento universal, encontrado em quase todos os povos ao longo da história. Por falar na relação entre Jesus e o Pão, lembremos o Evangelho de São João:
"Eu sou o Pão da Vida!" (Jo 6, 48). A escolha do Pão é porque o Pão representa todos os alimentos. E a vida como fenômeno biológico subsiste graças à comida e à bebida. São os únicos bens materiais que não podem faltar jamais ao ser humano pois sua falta representam a morte. No entanto, é vergonhoso constatar que hoje mais de 1 bilhão de pessoas vivem no mundo, em estado de desnutrição crônica. Isso em países cristãos, muçulmanos, budistas. Para que serve uma religião cujos fiéis não se sensibilizam com a fome alheia? Por que tanta indiferença diante dos povos famintos? O que significa adorar a Deus se ficamos de costas ao próximo que padece de fome? (1Jo 3, 17). 
Jesus fez a partilha do pão e do vinho, da comida e da bebida, o sacramento central da comunidade de seus discípulos - A Eucaristia. Ensinou que repartir o Pão é partilhar Deus. A partilha do pão é a marca de toda a militância de Jesus (Lc 6, 21). A comensalidade era a expressão vivencial mais característica de sua espiritualidade, para a qual havia uma íntima relação entre o Pai (amor de Deus e a Deus) e o Pão (o amor ao próximo). A oração de Jesus articula bem essa relação. Deus só pode ser chamado de Pai Nosso se também o Pão não for só meu mas nosso, de todos. Por esta relação se justifica a ausência de preconceitos em Jesus e sua facilidade de se sentar à mesa com os pecadores e publicanos ainda que isto lhe valesse a fama de comilão e beberrão. (Lc 7, 34). Partir o Pão era algo tão característico de Jesus que os discípulos de Emaús o identificassem (Lc 24, 30). E a Ceia se tornou o sacramento por excelência da presença e da memória de Jesus (Mc 14, 22ss). 
O Pão, eis o símbolo mais expressivo da prática de Jesus, a ponto de transubstanciá-lo em seu corpo. E todo Pão se oferece ao faminto tem um caráter sacramentental (Mt 25, 31-46). Ali é ao próprio Jesus que se oferece. Às vésperas de sua morte, Jesus nos antecipou a sua Ressurreição ao dividir com seus discípulos, na ceia, o pão e o vinho. Ele se deu a nós. No gesto de Justiça, ao partilhar o Pão nós nos damos a ele. Eis o sentido Evangélico da Comunidade, da comunhão. È o que retrata a Parábola do Pai misericordioso, na qual o perdão ao filho que se perdeu no mundo e retorna é celebrado em torno da comida. 
Pão: bem essencial à vida, dom maior de Deus, que se fez carne e se fez pão, o que levou Jesus a afirmar: "O Pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo." (Jo 6, 51). Se já não temos entre nós a presença visível de Jesus, ao menos adotemos como sinal de sua presença, isto que ele mesmo escolheu na Última Ceia: o Pão. Sinal de que somos também discípulos, empenhados em tornar realidade para todos "o pão nosso de cada dia", os bens que imprimem saúde, dignidade e felicidade à nossa existência.

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